Assédio no trabalho contra mulheres: o que é, como identificar e como agir com segurança
- Priscila Stacul

- 24 de jul.
- 8 min de leitura

Antes de tudo: você não está exagerando. E não está sozinha.
Muitas mulheres que sofrem assédio no ambiente profissional sentem dúvida, vergonha ou até culpa. Será que fui eu que entendi errado? Talvez eu esteja sendo sensível demais… Essas frases são parte do que o próprio assédio gera: confusão e isolamento.
Mas o que você sente é real. E tem nome: assédio.
O que é assédio no trabalho?
Assédio é qualquer comportamento repetitivo ou intencional que cause constrangimento, humilhação, intimidação ou desequilíbrio emocional. Pode ser moral ou sexual — e ambos são formas de violência.
Assédio moral vs assédio sexual: qual a diferença?
Assédio Moral
Humilhações públicas e constrangimentos:
Fazer comentários ofensivos, criticar o trabalho de forma desnecessária e desrespeitosa. Xingamentos, gritos, humilhações em público ou privado. Ridicularização constante
Isolamento e exclusão:
Impedir o contato com colegas, retirar tarefas importantes sem justificativa, ignorar a presença do trabalhador.
Pressão excessiva e cobranças indevidas:
Atribuir tarefas impossíveis de serem cumpridas, monitorar o tempo de trabalho de forma excessiva. Sobrecarregar a funcionária intencionalmente. Ameaças sutis ou explícitas de demissão
Intromissão na vida pessoal:
Fazer comentários sobre a vida privada do trabalhador, criticar suas escolhas pessoais.
Discriminação:
Tratar o trabalhador de forma diferente por motivos de raça, gênero, orientação sexual, etc.
Exemplo real: uma mulher é constantemente chamada de “incompetente” por seu gestor, mesmo realizando suas tarefas corretamente. Outros colegas riem. Ela começa a desenvolver ansiedade e medo de ir trabalhar.
Assédio Sexual
Por chantagem:
Quando a aceitação ou rejeição de uma investida sexual é determinante para decisões favoráveis ou prejudiciais no trabalho. Como condicionamento de promoções ou estabilidade a favores sexuais
Por intimidação:
Condutas que criam um ambiente de trabalho hostil, intimidativo ou humilhante, como a exibição de material pornográfico.
Outras formas:
Insinuações, gestos ofensivos, piadas de conteúdo sexual, contato físico indesejado, envio de conteúdos inapropriados por meios eletrônicos, convites insistentes para encontros, mesmo com recusas, comentários sobre o corpo ou identidade de gênero, entre outros.
Exemplo real: uma funcionária é pressionada por seu chefe com frases como “se você for mais carinhosa comigo, posso te indicar para aquela vaga.” Ela se sente paralisada e com medo de perder o emprego.
Quem pode ser vítima ou agressor?
O assédio sexual pode ocorrer entre pessoas com diferentes níveis hierárquicos ou entre colegas.
A vítima pode ser qualquer pessoa, mas as mulheres são frequentemente o alvo.
O agressor pode ser um colega de trabalho, superior hierárquico ou até mesmo um cliente ou fornecedor.
O que torna o assédio ainda mais silencioso?
Medo de retaliação (perder o emprego, sofrer represálias)
Falta de apoio interno (RH omisso, colegas que não se posicionam)
Normalização (“ele é assim mesmo”, “leva na esportiva”)
Culpa internalizada (“será que eu dei abertura?”)
O que diz a legislação brasileira?
Assédio sexual
É crime, previsto no Art. 216-A do Código Penal:
“Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico.”
Pena: detenção de 1 a 2 anos.
Legislação e Normativas Relevantes:
Lei nº 10.224/2001: Tipifica o crime de assédio sexual, estabelecendo pena de detenção de 1 a 2 anos para quem constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se da condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao cargo.
Lei nº 14.457/2022: Determina medidas para prevenir e combater o assédio sexual e outras formas de violência no ambiente de trabalho, incluindo a criação de canais de denúncia nas empresas com CIPA e a realização de ações de capacitação sobre o tema.
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT): Embora não defina diretamente o assédio sexual, a CLT estabelece princípios como a proteção ao trabalhador e a dignidade da pessoa humana, que são relevantes na análise e combate ao assédio.
Código Penal: O assédio sexual também pode ser enquadrado em outros tipos penais, além do previsto na Lei nº 10.224/2001.
Resolução nº 351/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ): Essa resolução estabelece diretrizes para que os órgãos do Judiciário criem ambientes de trabalho seguros e acolhedores, livres de práticas abusivas.
Lei nº 14.612/2023: altera o Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/1994) para incluir o assédio moral, o assédio sexual e a discriminação como infrações ético-disciplinares no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Essa lei visa coibir e punir tais condutas no exercício da advocacia.
Como denunciar o assédio sexual no trabalho?
Espaços de confiança da empresa: Ouvidorias, caixas de sugestões.
Organizações sindicais: Sindicatos ou associações.
Órgãos de fiscalização: Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho.
Autoridades policiais: Delegacia da Mulher (se a vítima for mulher) ou delegacia comum.
Canal de denúncias: Algumas empresas possuem canais específicos para denúncias de assédio.
Atenção: Reúna provas como mensagens, e-mails, testemunhas, etc.
Assédio moral
Ainda não tem tipificação penal, mas é passível de indenização civil, segundo a Constituição e jurisprudência da Justiça do Trabalho. A empresa pode ser responsabilizada por omissão.
Legislação e Normas:
Lei 14.457/22: Esta lei estabelece o Programa Emprega + Mulheres, que inclui medidas para prevenir e combater o assédio no ambiente de trabalho, além de promover a igualdade de gênero.
CIPA: Empresas com Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio (CIPA) devem incluir a prevenção do assédio em suas atividades e implementar canais de denúncia para casos de assédio sexual e outras formas de violência.
Treinamentos: A lei exige treinamentos anuais para todos os níveis hierárquicos sobre temas relacionados à violência, assédio, igualdade e diversidade no trabalho.
Código Civil: O artigo 186 do Código Civil estabelece que qualquer ação ou omissão voluntária que cause dano a outrem, mesmo que exclusivamente moral, é considerada ato ilícito.
Outras Leis e Resoluções: Existem projetos de lei em tramitação e resoluções, como a Resolução nº 351/2020 do CNJ, que tratam sobre o assédio moral no ambiente de trabalho.
Conceito e Caracterização:
O assédio moral é caracterizado por condutas abusivas repetitivas, que visam humilhar, constranger ou desestabilizar emocionalmente o trabalhador.
Essas condutas podem se manifestar por meio de palavras, gestos, comportamentos ou exclusão do trabalhador.
A diferença entre o assédio moral e situações de mero dissabor ou aborrecimento é a intensidade e duração da conduta abusiva, que deve ser capaz de causar danos à dignidade e integridade do trabalhador.
Responsabilidades e Sanções:
O empregador é responsável por garantir um ambiente de trabalho seguro e livre de assédio.
A ocorrência de assédio moral pode gerar responsabilização civil e penal do assediador, além de sanções disciplinares para o empregador que permitir a ocorrência.
A comprovação do assédio moral pode ser um desafio, por isso, é importante que as empresas disponibilizem canais de denúncia e realizem investigações adequadas.
Recursos e Apoio:
O departamento de Recursos Humanos (RH) desempenha um papel fundamental na prevenção e combate ao assédio moral.
Empresas devem implementar canais de denúncia seguros e eficazes, além de oferecer suporte aos trabalhadores que foram vítimas de assédio.
É importante que os trabalhadores estejam cientes de seus direitos e saibam como denunciar casos de assédio.
Como agir se você estiver passando por isso?
1. Documente tudo:
Anote datas, horários, frases, testemunhas. Guarde e-mails, prints, mensagens, fotos, vídeos e qualquer evidência que possa comprovar o assédio.
2. Busque apoio emocional e jurídico:
Fale com alguém de confiança. Procure uma psicóloga, uma advogada, ou redes de apoio. Entre em contato com sindicatos, órgãos de proteção ao trabalhador, Ministério Público do Trabalho (MPT) ou a polícia..
3. Denuncie:
Ouvidoria da empresa: Muitas empresas possuem canais internos para receber denúncias de assédio, com o objetivo de garantir um ambiente de trabalho seguro e livre de violência.
Ministério Público do Trabalho (MPT): O MPT pode investigar o caso e tomar as medidas cabíveis contra o assediador.
Delegacia da Mulher ou delegacia comum: A denúncia em delegacia pode levar à abertura de um inquérito policial para apurar o crime de assédio.
Superintendência Regional do Trabalho: A Superintendência pode fiscalizar a empresa e tomar medidas administrativas caso o assédio seja comprovado.
Delegacia Regional do Trabalho (DRT): Em casos de assédio envolvendo terceirizados ou empregados públicos, a denúncia também pode ser feita na DRT.
4. Procure a Justiça do Trabalho:
Mesmo após demissão, é possível mover ações trabalhistas por assédio.
Medidas para evitar o assédio sexual no trabalho:
Políticas da empresa: Estabelecer e divulgar políticas claras sobre assédio, com direitos e deveres dos trabalhadores e da empresa.
Treinamento: Promover treinamentos sobre o tema para todos os colaboradores.
Canais de denúncia: Implementar canais seguros e confidenciais para denúncias.
Cultura organizacional: Promover uma cultura de respeito e igualdade no ambiente de trabalho.
Combate à impunidade: É fundamental que as empresas e gestores adotem medidas que não só punam os assediadores, mas também previnam a ocorrência do crime.
Adoção da Convenção 190 da OIT: A Convenção 190 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) reconhece o direito das pessoas a um ambiente de trabalho livre de violência e assédio, sendo importante que o Brasil ratifique esse tratado.
Psicoterapia: espaço seguro pra reconstruir autoestima e recuperar o seu valor
O assédio adoece. Ele mexe com a autoconfiança, com o senso de merecimento, com a força de acreditar em si mesma. Na psicoterapia, você pode nomear a dor, elaborar o trauma e, principalmente, reconhecer que o que aconteceu não foi culpa sua.
Efeitos do assédio sexual na saúde mental:
Transtornos de ansiedade: O assédio pode desencadear ou agravar transtornos de ansiedade, como síndrome do pânico, levando a crises de ansiedade e ataques de pânico.
Depressão: A exposição a situações de assédio pode levar à depressão, com sintomas como tristeza profunda, perda de interesse em atividades prazerosas e alterações no sono e apetite.
Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT): O assédio sexual, sendo um evento traumático, pode causar TEPT, com flashbacks, reações emocionais intensas e evitação de situações relacionadas ao trauma.
Problemas de sono: O assédio pode afetar a qualidade do sono, levando a insônia, pesadelos e dificuldade para relaxar.
Baixa autoestima e insegurança: A vítima pode desenvolver sentimentos de baixa autoestima, insegurança e autodesvalorização devido ao assédio.
Dificuldades de relacionamento: O assédio pode prejudicar os relacionamentos interpessoais, tanto no trabalho quanto na vida pessoal, com dificuldades de confiança e comunicação.
Problemas de saúde física: Além dos impactos psicológicos, o assédio pode levar a problemas de saúde física, como dores de cabeça, tensão muscular e problemas gastrointestinais, decorrentes do estresse.
O papel da psicoterapia:
A psicoterapia pode ser um espaço seguro e acolhedor para a vítima de assédio sexual no trabalho expressar seus sentimentos, elaborar o trauma e desenvolver estratégias de enfrentamento. O psicólogo pode ajudar a vítima a:
Processar o trauma: A terapia pode ajudar a vítima a processar a experiência traumática, reduzir a intensidade das lembranças dolorosas e desenvolver mecanismos de adaptação saudáveis.
Gerenciar a ansiedade e a depressão: O psicólogo pode utilizar técnicas terapêuticas para reduzir os sintomas de ansiedade e depressão, promovendo o bem-estar emocional da vítima.
Reconstruir a autoestima: A terapia pode ajudar a vítima a ressignificar a experiência do assédio, fortalecer a autoestima e recuperar a confiança em si mesma.
Desenvolver habilidades de enfrentamento: O psicólogo pode ensinar à vítima técnicas de enfrentamento para lidar com situações de assédio, como assertividade, comunicação eficaz e estabelecimento de limites.
Recuperar a segurança no ambiente de trabalho: A terapia pode ajudar a vítima a recuperar a confiança no ambiente de trabalho, desenvolver estratégias para lidar com o assédio e buscar apoio para denunciar o agressor.
É importante buscar ajuda profissional:
A psicoterapia é um recurso valioso para vítimas de assédio sexual no trabalho, e é fundamental buscar ajuda profissional caso esteja enfrentando essa situação. O psicólogo pode oferecer apoio, orientação e as ferramentas necessárias para a recuperação e o enfrentamento do assédio.
Canais de apoio e denúncia no Brasil:
Disque 180 – Central de Atendimento à Mulher
Ministério Público do Trabalho (MPT)
Ouvidorias corporativas
Justiça do Trabalho
Psicólogos e advogados especializados
Você merece trabalhar em paz. Com dignidade. Com respeito.
Se você sentiu que esse texto te representa, ou lembra de alguém que precisa desse apoio, compartilhe. E saiba: você não está sozinha.
Referências:
Constituição Federal, art. 5º, X
Código Penal, art. 216-A (Lei nº 10.224/2001)
Cartilha do MPT: Assédio Sexual e Moral no Trabalho
OIT – Organização Internacional do Trabalho
IBGE (2019): 1 em cada 4 mulheres afirma já ter sofrido assédio no trabalho no Brasil







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