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"Nem comigo, nem sem mim": Quando alguém prende dois amores e não escolhe nenhum

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Amor ou controle?

Você já ouviu ou viveu uma história parecida com esta:

“Ele diz que me ama, mas não está pronto pra se comprometer. Diz que sente muito pela outra também, e não quer magoar ninguém. Mas também não se afasta de mim. Toda vez que tento ir embora, ele aparece. Faz promessas, chora, e diz que precisa de tempo…”


Esse é um padrão emocional mais comum do que parece. E não é amor indeciso: é um tipo de vínculo baseado na ambivalência, na insegurança e na necessidade de controle. Às vezes, chega a envolver características manipulativas ou narcisistas.


O que a psicologia entende por esse comportamento?

Em muitos casos, essa pessoa não está dividida entre dois amores ela está dividida entre o medo da solidão e a incapacidade de se comprometer. Ela prefere manter dois vínculos simultaneamente, nutrindo ambos com promessas, gestos ambíguos e declarações seletivas. O objetivo não é amar bem, mas manter controle emocional e alimentar a autoestima.


Termos técnicos que explicam a dinâmica:

  • Ambivalência afetiva: o desejo de proximidade e medo de compromisso coexistem. Também utilizado para à experiência simultânea de sentimentos opostos, como amor e ódio, em relação à mesma pessoa, objeto ou situação.

  • Vínculo ansioso-ambivalente: um estilo de apego inseguro que se manifesta na infância e pode influenciar os relacionamentos na vida adulta. Pessoas com esse estilo frequentemente experimentam ansiedade em seus relacionamentos, com medo de abandono e dificuldade em confiar nos outros, mas também desejam proximidade e validação emocional. 

  • Triângulo amoroso como defesa narcisista: manter múltiplas fontes de validação para evitar confrontar o próprio vazio afetivo. Ou seja, é uma estratégia manipuladora que protege a frágil autoimagem do narcisista, mantendo-o no centro das atenções e livre de compromissos emocionais genuínos.


Como esse comportamento se manifesta:

  • Declarações afetivas sem ação prática (“Você é tudo pra mim”, mas nunca te assume)

  • Reaparecimentos estratégicos quando percebe que a outra pessoa vai se afastar

  • Criação de dependência emocional por gestos intensos, seguidos de sumiços

  • Transferência de culpa: “você que está cobrando demais” ou “você que não me entende”


Os efeitos em quem está sendo envolvido

Estudos mostram que vínculos ambivalentes como esse geram:

  • Ansiedade persistente: um quadro de preocupação excessiva e persistente que afeta a capacidade da pessoa de funcionar normalmente no dia a dia.

  • Baixa autoestima: pois a pessoa começa a se questionar: “por que não sou suficiente?”

  • Vínculo traumático: laços formados por reforço intermitente, semelhantes aos vistos em relacionamentos abusivos

Esse ciclo é vicioso: quanto mais a pessoa espera ser escolhida, mais se sente culpada por “pressionar”. A esperança se mistura com autonegação.


Por que é tão difícil sair?

  1. Medo da rejeição e da solidão: O apego ansioso faz com que a dor de perder o outro pareça maior do que a dor de se perder.

  2. Esperança de mudança: Acreditar que "um dia ele vai perceber que sou eu".

  3. Culpa internalizada: A narrativa que a pessoa cria: “talvez eu esteja mesmo exagerando”, “talvez ele esteja confuso mesmo”.

  4. Falta de referência de relações saudáveis: Muitos só reconhecem esse tipo de amor, com picos de emoção e sofrimento, como se fossem a norma.


O que os especialistas dizem:

Esther Perel, terapeuta de casais, explica que a ambivalência emocional geralmente esconde medo de perder a liberdade, mas também de não ser amado.

“A indecisão prolongada não é hesitação. É manipulação.”

Brené Brown, pesquisadora em vulnerabilidade, afirma que relacionamentos saudáveis exigem coragem para estar presente e responsabilidade emocional pelas próprias ações.

John Bowlby, criador da Teoria do Apego, já alertava: "O apego inseguro é como um ímã emocional: gruda quando mais frágil, mas nunca garante segurança."


Caminhos possíveis para quem está preso nesse ciclo

Romper com alguém que você ama (ou acredita que ama) é difícil. Romper com alguém que te dá migalhas, mas te mantém emocionalmente preso(a)? É ainda mais difícil, porque a ligação se constrói em cima de:

  • esperança emocional

  • reforço intermitente

  • e promessas não cumpridas.

Mas existem caminhos. E eles não passam por esperar que o outro “mude” ou “te escolha” e sim por se reconectar consigo mesmo(a).


1. Reconheça o padrão (e nomeie o que está acontecendo)

O primeiro passo é sair da névoa emocional. Enquanto você pensar ele(a) só tá confuso(a), você vai justificar tudo. Mas quando você diz: Estou num ciclo onde a pessoa não me escolhe, mas também não me deixa ir… Você começa a retomar o controle da sua narrativa.

Dica prática: escreva os comportamentos dessa pessoa e como você se sente depois de cada um. Perceba o padrão emocional que se repete.


2. Questione as promessas que nunca se concretizam

Pergunte a si mesmo(a): Se essa pessoa realmente quisesse estar comigo, já não teria escolhido? Quantas vezes ela prometeu algo e não cumpriu? Quanto tempo mais estou disposto(a) a esperar sem ação concreta?

Lembre-se: indecisão prolongada é uma decisão. Quem está em cima do muro escolheu não se comprometer mas quer que você continue ali, como opção.


3. Restaure seus limites afetivos

Você não precisa brigar, gritar ou exigir. Mas precisa estabelecer limites reais.

Exemplo de limite saudável: Eu entendo que você esteja confuso(a), mas eu não quero mais viver nesse espaço de dúvida. Eu preciso de alguém que esteja comigo por inteiro. Não vou mais me disponibilizar enquanto isso não for claro.

Não se trata de ameaça. É posicionamento emocional.


4. Reconstrua sua autoestima em espaços seguros

Pessoas com autoestima abalada se tornam mais vulneráveis a relações ambíguas. Porque elas aceitam pouco, achando que é muito.

A psicoterapia é o espaço onde você pode:

  • Reconstruir sua percepção de valor

  • Entender os motivos inconscientes que te mantêm nesse ciclo (ex: padrões familiares, histórico de rejeição)

  • Aprender a amar sem precisar se anular

Terapia não é pra quem tá “louco”. É pra quem cansou de viver no piloto automático.


5. Crie uma rede de apoio

Ficar sozinho(a) nesse processo pode ser mais difícil. Compartilhe com amigos de confiança. Participe de grupos de apoio. Consuma conteúdos que validem sua dor sem romantizar a espera.

Evite conselhos que culpabilizam, como: Você gosta de sofrer, Você que aceita. Lembre que você não escolheu se machucar. Mas pode escolher parar de se machucar agora.


6. Lembre-se: quem ama, escolhe.

Talvez o maior aprendizado seja esse: Quem quer de verdade, não hesita sempre. Quem sente amor maduro, age com clareza. Quem só alimenta esperança, mas não entrega presença… está escolhendo a si, não a você.

Você pode seguir amando, mas não precisa continuar se anulando.


Quem ama de verdade, escolhe.

Ficar em cima do muro é uma escolha. Deixar os outros pendurados é uma forma de controle. E amar, de verdade, exige presença, clareza e responsabilidade emocional.


Se você está em uma relação onde vive esperando por uma escolha… talvez seja a hora de você mesmo(a) se escolher primeiro.



 
 
 

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